segunda-feira, 8 de setembro de 2008


... uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.
Clarice Lispector

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Que Belo e Estranho Dia Para Se Ter Alegria




Notícias perderão todo controle dos fatos Celebridades cairão no anonimato
Palavras deformadas
Fotos desfocadas
Vão atravessar o Atlântico
Jornais sairão em branco
E as telas planas de plasma vão se dissolver
O argumento ficou sem assunto
Vai ter mais tempo pra gente ficar junto
Vai ter mais tempo pra enlouquecer com você
Vai ter mais tempo pra gente ficar junto
Vai ter mais tempo pra enloquecer
Os políticos amanhecerão sem voz
O outdoor com as letras trocadas
Dentro do Banco Central
O pessoal vai esquecer como é que assina
A própria assinatura
E os taxistas já não sabem que rua pegar
Que belo estranho dia pra se ter alegria
Eu respondo e pergunto
É só o tempo pra gente ficar junto
É só o tempo de eu enloquecer com você
É só o tempo pra gente ficar junto
É só o tempo de eu enlouquecer
Alarmes já pararam de apitar
O telefone celular descarregou
O aeroporto tá sem teto
E a moça da TV prevê
Silêncios e nuvens
A firma que eu trabalho faliu
E o governo decretou feriado amanhã no Brasil
Será que é pedir muito?
É só um jeito da gente ficar junto
É só um jeito de enlouquecer com você
É só um jeito da gente ficar junto
É só um jeito de enlouquecer com você.



Roberta Sá


Existem pessoas que cosem pra fora, outras cosem pra dentro, eu não coso. Prefiro viver minha vida em fragmentos, os quais em cada um posso ter a liberdade de errar e acertar, sem me preocupar muito com o retalho da frente ou o anterior. Gosto da minha vida inconsútil, já que a cada dia sinto-me livre para relembrar momentos, para construir momentos, para ser feliz.
É o que alguns chamam de viver a vida intensamente, como se cada dia fosse ser o último. Eu prefiro dizer que vivo a vida porque sei que o principal valor da vida é a própria vida, e a fragmento com a certeza de que a cada episódio posso opinar em excluí-lo ou guardá-lo para que no fim, apenas no fim, seja feita uma grande colcha, e que a mesma console, cubra e proteja as pessoas que já não mais acreditam no amor e na verdadeira significação da vida, e por isso são quizilentos.
Acho essa uma boa desculpa para minha alegria constante, para meus risos incessantes e para meu humor insigne. Tento passar às pessoas que vale a pena sorrir apesar dos pesares. E que embora nossa vida seja como uma colcha de retalhos há como tamparmos o passado curtindo o presente que é a espera do futuro, sem nos preocupar muito em viver de acordo com um tamanho exato de pano, ousando sempre ampliar as alegrias e diminuir sempre que possível as mazelas da vida.
Isso dá uma liberdade tão grande quanto a alegria que fluirá ao ver sua colcha repleta de bons momentos, felicidades e diversões. Mas no fim, lá nas prestações de conta, enquanto isso prefiro não costurar minha vida, remetendo sempre esta culpa.


Carol Zacarias